A Fala do Presidente Lula sobre a Anvisa: Uma Análise Crítica

Recentemente, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez declarações contundentes sobre a lentidão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na análise de processos e liberação de registros. Esse posicionamento, embora pareça endereçar um problema real enfrentado pela agência, revela uma complexidade maior que merece ser explorada.

• Anvisa: Uma Agência Reguladora Independente

A Anvisa é uma agência reguladora independente, criada para garantir a segurança, a qualidade e a eficácia de produtos e serviços relacionados à saúde no Brasil. Sua autonomia é fundamental para a proteção da saúde pública, permitindo que decisões sejam técnicas tomadas com base em evidências científicas, longe de pressões políticas. No entanto, essa independência também pode ser vista como um obstáculo em tempos de urgência, como durante crises sanitárias, ou mesmo quando o governo possui um perfil mais intervencionista.

• Um Viés Autoritário em Tempos de Mudança

A fala de Lula sobre a Anvisa não pode ser dissociada de um contexto mais amplo de críticas a outras agências reguladoras, como a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e até mesmo à política de juros implementada pelo Banco Central.

A retórica utilizada pelo governo sugere um viés autoritário, onde a culpa é atribuída a instituições independentes em vez de se considerar as limitações impostas por cortes orçamentários e pela falta de recursos humanos.

Essa abordagem se torna ainda mais evidente em um período de troca de mandato do diretor-presidente da Anvisa (previsto para dezembro próximo), indicado no governo anterior, o que pode ser interpretado como uma tentativa de deslegitimar a continuidade de políticas públicas que não se alinham com a nova administração, bem como já abre a disputa para uma nova indicação por parte da base aliada.

• O Impacto dos Cortes Orçamentários

É importante ressaltar que a crítica à Anvisa não aborda os cortes orçamentários implementados pelo atual governo, que resultaram na redução significativa do número de servidores e na defasagem salarial dos profissionais que permanecem na agência.

Esses fatores têm um impacto direto na capacidade da Anvisa de operar de forma eficaz. A carga de trabalho aumentou consideravelmente, e a falta de recursos e de pessoal em número adequado compromete a agilidade nas análises e liberações de registros.

• Um Discurso Populista e Demagógico

A retórica do Presidente Lula pode ser vista também como um discurso populista e demagógico (vale observar que foi proferida quando da inauguração de uma nova planta de uma importante fábrica de medicamentos genéricos) e que não enfrenta as causas estruturais dos problemas enfrentados pela Anvisa e outras agências reguladoras.

Ao invés de propor políticas ou programas que fortaleçam essas instituições, a crítica se concentra nas consequências da lentidão, desviando a atenção das reais necessidades de investimento e reestruturação.

Além do mais, a ilação de que a agência seria mais célere caso a vida de algum familiar de um servidor necessitasse da liberação de determinado remédio, se partindo de um cidadão comum já seria no mínimo irresponsável ou desarrazoada, sendo proferida pela maior autoridade pública do país se torna ainda mais grave e condenável.

• Conclusão

A fala do Presidente Lula sobre a Anvisa, embora legítima em sua preocupação com a saúde pública, carece de uma análise mais profunda das causas que levam à lentidão nos processos da agência. A crítica às agências reguladoras, sem um plano claro de ação para fortalecê-las, pode resultar em um enfraquecimento da autonomia institucional e na perpetuação de problemas que afetam a população.

Para um verdadeiro avanço, é necessário um compromisso com a valorização das agências reguladoras e a busca por soluções que vão além do discurso, enfrentando as questões estruturais que afetam seu funcionamento, principalmente, as garantias de manutenção das suas prerrogativas de independência e o fortalecimento de sua infraestrutura.